Uma crónica de Ferreira Fernandes

1. Com a devida vénia, do Diário de Notícias de 11/02/2015, última página, se transcreve esta crónica exemplar da coluna “UM PONTO É TUDO” de Ferreira Fernandes… Pois é. Era para ser a crónica “O cancro da Grécia ou o ébola da Ucrânia?” de 11/02/2015. Porém, ao ler hoje (23/02/15) o DN , não resisti a trocá-la por esta “Elogio à compaixão da Alemanha”. (Entretanto o leitor que aprecie crónicas exemplares – todas elas são exemplares… – pode muito bem ler online a que foi aqui substituída). A crónica de hoje é tão conforme, está tão na ordem do dia, que acabou sendo a preferida. Aqui vai então:

“Elogio à compaixão da Alemanha

Maria Luís Albuquerque foi à Alemanha fotografar-se com Wolfgang Schaüble. A portuguesa não foi ao beija-mão. Foi pior do que isso, o alemão é que achou que devia dar uma mão à sua fiel Albuquerque. Escrevi fiel, não leal. Lealdade é sentimento entre iguais. No final da reunião do Eurogrupo que abriu uma porta, o grego Varoufakis disse o que se ia fazer: “Acordámos (…) uma nova lista de reformas que vamos abordar de um modo escolhido por nós em colaboração com os nossos parceiros. Não iremos continuar a seguir o guião que nos foi dado por agências exteriores.” Isto é, o grego disse: estamos em crise, mas não deixamos de ser um país independente. Isto é, não aceitou ser o “protectorado” que o governo português disse com todas as letras ser. Sobre os que governaram assim, Varoufakis disse: “Eles nunca imaginaram a possibilidade de dizer não. Quando não se consegue imaginar a possibilidade de dizer não, não se está a negociar. E quando não se está a negociar numa situação como a da crise da zona euro, acaba-se a aceitar um acordo em que no fim (…), além de mau para os fracos, é mau para os fortes.” A Alemanha reconheceu isso e vai mudar. Por isso é que piedosamente deu uma mão aos seus fiéis. Quando os lusitanos Andas, Ditalco e Minuro, comprados pelo general romano Cipião, mataram Viriato, foram pedir a paga. Foram mortos e expostos com um cartaz: “Roma não paga a traidores.” Sorte a do governo português, Berlim paga.”

2. Mas, já que a outra cá estava transcrita para ser o texto desta postagem, vou deixá-la também, porque todas elas são exemplares e não vai ser preciso , ao deparante de acaso ou adrede visitante deste blogue, ter de se “deslocar” ao sítio do Diário de Notícias: pode lê-la também aqui. Aí vai então a de 11/02/15:

“O cancro da Grécia ou o ébola da Ucrânia?

A União Europeia que, por via da Grécia, já não sabe se amanhã é União Europeia, está com a cabeça ocupada fora da União Europeia. É como se um filho mandasse um telegrama à família: “Não posso ir ao enterro da mãe, tenho outro.” E o drama é que é um telegrama avisado. Merkel e Hollande têm mesmo de estar onde têm estado, em Minsk ou onde quer que se discuta a situação das Ucrânias (isso, no plural, para que se perceba que não é de uma guerra que se trata, mas de mais brutal, uma guerra civil). O cancro da Grécia ou o ébola da Ucrânia? Optou-se pelo mal menos epidémico. E se alguém lembra: “Mas se Grécia sai, não é também uma epidemia, um castelo de cartas a ruir?”, Merkel e Hollande não podem senão correr com o confusionista da unidade de cuidados intensivos… A Europa está na típica situação de quem não sabe para onde se virar porque quando a cabeça não ajuda é o continente que paga. Tinham uma união política e uma união monetária a construir e esqueceram-se da palavra de ligação: união. Com a Ucrânia, outra inadvertência: a Europa não tinha armas e deveria ter uma política e esqueceu-se de que não tinha as primeiras e escolheu mal a segunda. Não devia ter acirrado a Ucrânia contra a Rússia. Devia, como europeia, ter pensado Ucrânia e Rússia. E porque era a menos envolvida deveria ter agido de cabeça fria. Chama-se política, a arte do compromisso, que é coisa que devia ser entregue só a grandes. Mas grandes, que é deles?”

3. Análise linguístico-literária. Quando eu comecei a estudar coisas da língua portuguesa (e nunca mais deixei de o fazer até hoje, mesmo professor de Português aposentado e escrevinhador, não só para o blogue…) aprendi, e depois ensinei, continuando sempre a aprender, uma coisa que tinha (e tem) a ver com “as qualidades da boa linguagem: clareza, concisão e correcção”. E, se dou a estas crónicas de Ferreira Fernandes o epíteto de exemplares, é porque as considero mesmo exemplares. Tanto que, se ainda hoje estivesse efectivo, elas não escapariam de as levar para a aula de Português, fosse qual fosse o ano até ao 12º. Vejam vocês como num pequeno rectângulo vertical a finalizar o jornal, com não mais de cerca de 300 palavras, ele consegue dizer, sobre um tema que termina sempre, podemos dizer com chave de ouro como nos sonetos, tanta coisa, com tanta clareza e tal poder de concisão (de síntese), com uma linguagem correcta que, nem a opção pela ortografia de “uma coisa obscena chamada acordo ortográfico” (V.G.M.), diminui a arte da boa linguagem, por isso tudo, exemplar…

4. Comentário das mensagens. Como é que o autor consegue dizer tanta coisa – tema, texto e contexto – enriquecido e esclarecido com tantas referências – culturais, políticas, históricas – e uma tremenda relação de actualidade?!…

Parabéns, Ferreira Fernandes! Quando, diariamente, pego no Diário de Notícias, a minha leitura vai, logo, começar, na última página, pelo esplêndido ‘finzinho’ – “UM PONTO É TUDO”.

A metamorfose de cabeça… em cauda!

‘Molestado’ pelas constantes notícias que na Sexta-feira nos chegaram via rádio, televisão, e que por todo o lado se ouviam, na rua , nos cafés, na praça pública, vozes só de lamúria e ‘vil tristeza’… tive um sonho. Estava a reler mais uma vez Os Lusíadas. Ia no Canto III, estância 20:

Eis aqui , quási cume da cabeça
De Europa toda, o reino lusitano,
Onde a terra se acaba e o mar começa,
E onde Phebo repousa no Oceano.
[…]

Luís de Camões, Lus. III, 20

(Ortografia d’A Chave dos Lusíadas, 5ª Ed. A. Figueirinhas, 1944)  

De repente, aparece-me Camões, como que a querer ser-me prestável …
– Triste, a reler o meu Poema! Porquê, António?
Foi então que me lembrei de me queixar ao Épico que consentiu estabelecer comigo um estranho diálogo.
– Oh! Querido Luís! És Tu?! (Posso tratar-te por tu?)
– É claro que podes! Tantas vezes falaste de mim aos alunos!
– Para o bem e para o menos bem, meu caríssimo Luís… Enquanto cantaste a grandeza nossa – a tal grandeza lusa -, mas também a nossa vileza… Lembras-te?
– Então não lembro! E, já que estás a reler a minha, quero dizer, a ‘nossa’ Epopeia, dize-me, António, o que te dá assim tanta tristeza, hoje? Olha que, por muitas lamúrias que ouças, por muita desgraça que vos afecte, agora, não é nada de que eu não tenha avisado o meu, quero dizer, o ‘nosso’ Povo Luso. Relê tudo e até ao fim, sem te esqueceres dos meus comentários pessoais, propriamente mais líricos do que épicos. Para não me alargar mais, vou dizer-te de cor só duas estâncias, quase no fim. Queres ouvir’
– E tu ainda me perguntas, Luís, se eu quero ouvir-te?
– Lá vai então:

No mais, Musa, no mais, que a lyra tenho
Destemperada e a voz enrouquecida;
E não do canto, mas de ver que venho
Cantar a gente surda e endurecida.
O favor com que mais se accende o engenho,
Não no dá a Pátria, não, que está metida
No gosto da cobiça e da rudeza
D’ũa austera , apagada e vil tristeza.

E não sei por que influxo de destino
Não tem um ledo orgulho e geral gosto
Que os ânimos levanta de contino
A ter pêra trabalhos ledo o rosto.
Por isso vós, ó rei, que por divino
Conselho estais no régio solio posto,
Olhai que sois (e vede as outras gentes)
Senhor só de vassallos excelentes.

(Lus., X, 145, 146)

– Percebe-se bem, nos últimos versos desta estância, que o teu talento precisou de recorrer à tua capacidade poético-diplomática…
– Pois, António… E mesmo assim, apenas consegui que o ‘tresloucado rei’, a custo e com alguma reserva, autorizasse o Poema, e me concedesse uma miserável tença, condicional, que não evitou que eu morresse na miséria…
– Uma tença… precária, como se diz agora dos salários ou das pensões de não sei quantos milhões de portugueses… Então como agora, a precariedade, a pobreza, a miséria, não é?…
– Sabes? Quando eu morri, 1580, já o País estava impregnado daquilo que, já nessa altura, dois anos depois de Alcácer-Quibir, definitivamente se viria a transformar no mito sebastianista, e que, reforçado ainda por outros mitos, sobretudo de cariz religioso, condiciona a mentalidade deste nosso querido Povo Lusitano…  Que pena eu tenho do meu Povo!…
– Eu também… Mas, Excelente Luís,  permite-me que volte  à estância 20, aquela que me surpreendeste a ler. Como foi possível a metamorfose? Então, o reino lusitano, passou de cabeça a cauda da Europa toda? Como foi isso possível. Olha que até a Eslovénia, até a República Checa já nos passaram a perna, tendo entrado para a União muito depois de nós!… Na cauda da Europa?! Em tudo?! Achas alguma explicação? Mesmo que nos tenhas avisado no Poema, previas assim tanto e tão depressa?!
– Na verdade, acho que ultrapassaram todas as minhas previsões. E, se queres que seja franco, além das advertências que escrevi, não sei bem o que vos hei-de aconselhar agora. Se calhar teríamos de fazer uma alteração mas é à letra do Poema…
– Mas tu sabes que eu não sou poeta à tua altura…
– Não faz mal. Olha, eu poderia dar-te uma ajudinha na métrica. Nem é preciso mexer na rima. Basta mexer num verso. Assim. Toma nota:

Eis aqui, cauda já, não mais cabeça,
De Europa toda, o reino lusitano,
[…]

– ‘Cauda’ ou ‘quási cauda’, Luís?
– Eu queria manter o ‘quási’, mas, sabendo das manchetes de toda a comunicação social de hoje, achei melhor eliminar o advérbio…

O nosso querido Luís, como por encanto, desapareceu do sonho… e deixou-me a acordar gritando por ele:

– Luís! Luís Vaz!, Luís Vaz de Camões!…

Já acordado, comentei, com os meus botões, o sonho e a realidade:

– Como foi possível a metamorfose de  ‘cabeça’ em ‘cauda’?!

E fiquei a dedilhar, na fronha, uns decassílabos que se apropriassem:

Como (e quem e porquê) se transformou
A cabeça de Europa toda, em cauda?!

Mas, sem jeito nem estro, fiquei-me só a pensar… e não voltei a adormecer.

O Manifesto Em Defesa da Língua Portuguesa

Caro Vasco Graça Moura:

Li, como sempre, o seu artigo das quartas, no DN de 14/5/08, p. 10. Desde a primeira hora, eu, professor de Português, e os daqui de casa e arredores, estamos consigo, do lado do bom senso. Parabéns pelo seu incansável trabalho em defesa da Língua Portuguesa!

“Mas tu farás, que os que a mal julgaram,
E inda as estranhas línguas mais desejam,
Confessem cedo ant’ela quanto erraram.
E os que despois de nós vierem, vejam
Quanto se trabalhou por seu proveito,
Porque eles para os outros assi sejam.”

(António Ferreira – vide citação em postagem anterior)

Uma perolazinha de Caetano Veloso

Já que estamos nas pérolas da língua sobre a língua, expressões poéticas matalinguísticas, em português, sobre a língua portuguesa, aqui vos deixo, desta vez uma deliciosa perolazinha. Foi a minha memória que, ao lembrar-se vagamente da citação de uma canção e poema de Caetano Veloso, Língua, a quis sintetizar e a síntese, vejam só, saiu num perfeito verso alexandrino: “minha língua roçando a língua de Camões”.
Eis senão quando o meu editor encontrou o poema genuíno e… não havia nada de alexandrino. Vejam vocês como a nossa memória é fértil. Então aí vai a estrofe do poema, tal como foi escrito:

“Gosto de sentir a minha língua roçar a língua de Luís de Camões
Gosto de ser e de estar
E quero me dedicar a criar confusões de prosódia
E uma profusão de paródias
Que encurtem dores
E furtem cores como camaleões
Gosto do Pessoa na pessoa
Da rosa no rosa
E sei que a poesia está para a prosa
Assim como o amor está para a amizade
E quem há de negar que esta lhe é superior?
E deixa os Portugais morrerem à míngua
‘Minha pátria é minha língua'”

Outra pérola (a pérola das pérolas?)

Sustentava contra ele Venus bella,
Affeiçoada à gente lusitana

Por quantas qualidades via nella

Da antiga tam amada sua romana
Nos fortes corações, na grande estrella,
Que mostraram na terra tingitana,

E na língua, na qual, quando imagina,
Com pouca corrupção crê que é latina.

CAMÕES, (Lus., I – 33)

(Respeita-se a ortografia usada em A Chave dos LUSÍADAS, 5ª edição, Livraria Figueirinhas, Porto, 1944, que me serviu de ‘Manual’ ao estudar pela primeira vez a Epopeia.)

Outra pérola: António Ferreira

[…]

Floreça, fale, cante, ouça-se, e viva

A Portuguesa língua, e já onde for

Senhora vá de si soberba, e altiva.

Se téqui esteve baixa, e sem louvor,

Culpa é dos que a mal exercitaram:

Esquecimento nosso , e desamor.

Mas tu farás, que os que a mal julgaram,

E inda as estranhas línguas mais desejam,

Confessem cedo ant’ ela quanto erraram.

E os que despois de nós vierem, vejam

Quanto se trabalhou por seu proveito,

Porque eles para os outros assi sejam.

Se me enganei, se tive mau respeito,

Andrade, tu o julga: mas espero

De te ser este meu desejo aceito.

E enquanto mais não peço, isto só quero.

ANTÓNIO FERREIRA

(Assim termina a Carta III, LIVRO I – A Pêro de Andrade Caminha – )

Mais uma pérola da Língua: Vieira

Para ser pérola, não é preciso que seja em verso: desde que seja em prosa como a do tal ‘Imperador da língua portuguesa’. À falta de poema (Vieira não foi propriamente poeta, embora a sua prosa tenha atingido a grandiosa beleza estética da palavra), vamos transcrever aqui um trecho do Sermão da Sexagésima (penúltimo domingo antes Quaresma), que é uma espécie de sermão metalinguístico, como diriam os linguistas modernos, ou, por outras palavras, uma espécie de ‘arte poética’ da oratória sagrada, que poderá alegoricamente aplicar-se a todo o tipo de oratória, a todo o tipo de discursos, sejam eles religiosos – do púlpito – ou políticos – da tribuna…
Tirámos um excerto da parte IX, onde Vieira fala da palavra, das palavras do(s) pregador(es). Ora vejamos. Começa por uma pergunta que é a ‘deixa’ da parte anterior: “Pois se nenhuma destas razões que discorremos, nem todas elas juntas são a causa principal nem bastante do pouco fruto que hoje faz a palavra de Deus, qual diremos que é, finalmente, a verdadeira causa?

IX
“As palavras que tomei por tema o dizem: Sémen est verbum Dei. Sabeis, Cristãos, a causa por que se faz hoje tão pouco fruto com tantas pregações? É porque as palavras dos pregadores são palavras mas não são palavras de Deus.”
[…]
“Dizei-me, pregadores (aqueles com quem eu falo indignos verdadeiramente de tão sagrado nome), dizei-me: esses assuntos inúteis que tantas vezes levantais, essas empresas ao vosso parecer agudas que prosseguis, achaste-las alguma vez nos Profetas do Testamento Velho, ou nos Apóstolos e Evangelistas do Testamento Novo, ou no autor de ambos os Testamentos, Cristo? É certo que não, porque desde a primeira palavra do Génesis até à última do Apocalipse, não há tal coisa em todas as Escrituras. Pois se nas Escrituras não há o que dizeis e o que pregais, como cuidais que pregais a palavra de Deus? Mais: nesses lugares, nesses textos que alegais para prova do que dizeis, é esse o sentido em que Deus os disse? É esse o sentido em que os entendem os Padres da Igreja? É esse o sentido da mesma gramática das palavras? Não por certo; porque muitas vezes as tomais pelo que toam e não pelo que significam, e talvez nem pelo que toam. Pois se não é esse o sentido das palavras de Deus, segue-se que não são palavras de Deus. E se não são palavras de Deus, que nos queixamos que não façam fruto as pregações? Basta que havemos de trazer as palavras de Deus a que digam o que nós queremos, e não havemos de querer dizer o que elas dizem?! E então ver cabecear o auditório a estas coisas, quando devíamos de dar com a cabeça pelas paredes de as ouvir! Verdadeiramente não sei de que mais me espante, se dos nossos conceitos, se dos vossos aplausos? Oh que bem levantou o pregador! Assim é; mas que levantou? Um falso testemunho ao texto, outro falso testemunho ao santo, outro ao entendimento e ao sentido de ambos. Então que se converta o mundo com falsos testemunhos da palavra de Deus? Se a alguém parecer demasiada a censura, ouça-me.”
[…]

Comentário meu: tente o eventual visitante leitor substituir “palavras de Deus” por “palavras da Verdade” e “Escrituras” por “Vida real da sociedade em que vivemos” (e seus ‘parlapiadores’ – religiosos ou políticos) e será levado a pensar na tremenda actualidade destas palavras de Vieira.

Pérolas da língua sobre a língua

Já que estamos com as mãos na massa, que é como quem diz com os olhos em pérolas da nossa língua (não na nossa língua: piercing, não, nada disso credo!…), aqui vai mais uma, desta vez de Olavo Bilac, um dos maiores sonetistas em língua portuguesa. Vejam: “…os admiráveis sonetos de Tarde (1919), só comparáveis aos de Camões, aos melhores de Bocage e aos de Antero, quer pela perfeição formal, quer pela elevação de pensamento.” (in Dicionário de Literatura, Dir. de Jacinto do Prado Coelho, 1.º Vol., p. 108, Livraria Figueirinhas, Porto)

“FLOR DO LÁCIO

Última flor do Lácio, inculta e bela,
És, a um tempo, esplendor e sepultura:
Ouro nativo, que na ganga impura
A bruta mina entre os cascalhos vela…

Amo-te assim, desconhecida e obscura.
Tuba de alto clangor, lira singela,
Que tens o trom e o silvo da procela,
E o arrolo da saudade e da ternura!

Amo o teu viço agreste e o teu aroma
De virgens selvas e de oceano largo!
Amo-te, ó rude e doloroso idioma,

em que da voz materna ouvi: ‘meu filho!’,
E em que Camões chorou, no exílio amargo,
O génio sem ventura e o amor sem brilho!”