Vasco Graça Moura morreu!

O mais convicto, o mais convincente, o mais acertado e aguerrido opositor de “uma coisa obscena chamada Acordo Ortográfico” (palavras suas). Fica em sossego, bom escritor e bom poeta! O teu sonho ortográfico há-de ser realidade quando tiverem vergonha e bom senso os que detêm o poder!

Pessoas e coisas que eu não entendo: Vasco Graça Moura / Carlos Reis

Compro o DN todas as quartas-feiras. Para ler duas crónicas: a de Baptista Bastos e a de Vasco Graça Moura. Mas desde já digo que as deste último leio-as, geralmente a contragosto. Não pelo estilo – grande escritor, bom poeta e ainda melhor poeta-tradutor. E, nesse aspecto, merece ser lido. Quanto às ideias, aí, deixa-me muito baralhado: acérrimo militante contra “uma coisa obscena chamada Acordo Ortográfico” (na sua voz), é politicamente que ele me faz virar o juízo. Li, pois a sua crónica da quarta-feira passada (31/07/13): “Ainda o apanhamos”. Esta, porque pode ser neutra, é mesmo de não deixar de ler. “Ainda o apanhamos”: é assim que termina, como toda a gente escolarizada deve saber, o célebre romance Os Maias de Eça.Quem, por obrigação profissional, teve de ensinar Eça de Queirós no ensino secundário, não pôde passar sem frequentar o professor catedrático Carlos Reis, “sem dúvida, um dos maiores especialistas contemporâneos da obra de Eça de Queirós…”.

Mas eu, sinto uma pedra no sapato e não sei como livrar-me dela. É simples: como é que Vasco Graça Moura se entende com Carlos Reis quando falam (se falam…) n’“essa coisa obscena chamada Acordo Ortográfico”. E agora, perante as repetidíssimas notícias sobre os resultados negativíssimos dos exames de Português, tenho mesmo de perguntar aos dois tão ilustres entendidos na matéria: alguma vez falaram em que a  mais que provável  causa maior  desses resultados é, sem dúvida, a bagunça em que puseram a língua portuguesa com a ratificação ( a meu ver ilegítima, acho mesmo que ilegai, inconstitucional…) dessa tal “coisa obscena”?!.. Falaram nisso? Não falaram? E, enquanto falavam, não disseram os dois: “ainda o apanhamos”?!…

Em verdade vos digo, senhores ilustres professores e literatos, que enquanto não desratificarem (ia-me saindo desratizarem…) essa absurda ratificação, os resultados não vão melhorar. É que ninguém entende nada, ninguém se entende! E entretanto a língua – a nossa língua – vai-se deteriorando, não melhorando, não evoluindo. E “essa coisa obscena” vai-se tornando cada vez mais obscena; vai-se estragando e estragando a média avaliativa dos nossos alunos!

Acordo Ortográfico: quatro crónicas de Vasco Graça Moura

Trata-se de 4 crónicas de Vasco Graça Moura (VGM), escritor e poeta, amante, admirado cultor e grande defensor da Língua (a qual eu quero também amar, cultivar e defender), publicadas no Diário de Notícias, na sua coluna das quartas-feiras, página 54. A primeira, apenas citada, mas vale bem só pela citação. As outras três, transcritas na íntegra.

1. “O reino da insensatez”

Aqui fica a expressão mais forte com que o autor caracteriza o dito acordo: “…essa coisa obscena chamada Acordo Ortográfico” (VGM, in DN, 29/06/2011, p. 54) “

2. “O Acordo, outra vez”

“As questões de fundo relativas à aplicação do Acordo Ortográfico continuam por resolver. Não entrou em vigor, mas há sectores, tanto ofícíaís como privados, em que vigora sem rodeios especíaís o princípio do faz-de-conta. Faz-se de conta que o Acordo já se aplica de pleno e estropia-se alegremente a nossa língua. Jornais e edttoras continuam a fazê–lo da maneira mais bárbara. Há já alguns livros importantes que saem cheios dos correspondentes aleijões. E eles só não vieam ainda afectar uma séríe de clássicos da lingua pela razão singela de que cada vez menos se cura de editá-los e pô-los ao alcance de toda a gente.
Ninguém parece ter sequer acordado para a necessidade de uma revisão. As duas grafias coexistem, porque, felizmente, um quotidiano importante e urna grande parte dos colaboradores da imprensa lusítana se mantêm fiéis à grafia anterior e esta é, por enquanto, a única que, legalmente, pode e deve ser aplicada. Toda a gente sabe que é assim e não vale a pena repeti-lo.
É possível que o lobby das editoras, depois de se ter precipitado na adopção do Acordo em livros escolares, manuais, dicionários e agora noutras publicações , procure impor essa coisa sem nome em todos os sectores da vida nacional, em especial no escolar. Também é possível que o poder não saiba lá muito bem o que fazer seguindo e alimentando, neste aspecto, a desorientação nas escolas.
Os partidos políticos com assento parlamentar têm vindo a pactuar, sem excepção, com esse estado de coisas. Ninguém lucra absolutamente nada com ele..[Realçado no original] Mas tudo isso redundaria apenas num simples exercício de humor de gosto discutível, se não se traduzisse numa violência quotidiana contra a língua. E o certo é que, se as coisas continuarem assim, dentro de uma geração ninguém conseguirá pronunciar correctamente a língua portuguesa tal como ela é falada deste lado do Atlântico.
Por outro lado, o que interessa, para além da questão jurídica e cultural de fundo, é uma questão política assaz bizarra.[Realçado no original] E a questão política actualmente resume-se a isto: estão a ser aplicadas não uma, mas três grafias da língua portuguesa. A correcta, em países como Angola e Moçambique, a brasileira (no Brasil) e a pateta (em Portugal e não se sabe em que outras paragens). Os representantes dos Estados-membros na CPLP, esses devem dar pulinhos de corça alvoroçada e do mais puro regozijo com tão portentoso contributo que a organização deu para unificar a grafia do português.
Enquanto se anda nestes preparos, toda a gente se esqueceu do famigerado vocabulário ortográfico comum. Onde pára o dito? Dele, ninguém sabe dizer nada, como da formosa Mariquinhas… Até agora, o vocabulário peca pela inexistência pura e simples e ninguém se preocupou com a superação de tão momentosa dificuldade. Ora não parece que actualmente, com as restrições que afectam também tantas áreas da investigação e da diplomacia, haja qualquer possibilidade de ele ser concretizado.
Entre as consequências relevantes dessa inexistência conta-se a impossibilidade de aplicar o Acirdo de cuja entrada em vigor o vocabulário comum é condição prévia, por muito que isso pese ao Prof. Evanildo Bechara, que lê a exigência correspondente como se ela unicamente se reportasse ao vocabulário técnico e científico. É de lamentar que, na pessoa do ilustre académico, a interpretação jurídica não consiga acompanhar o saber do linguista emérito.
Além disso, é muito de estranhar que, no ano em que o Brasil se apresenta em Portugal e Porugal se apresenta no Brasil com tanta pompa e circunstância, nenhum dos países interessados tenha feito qualquer reparo à maneira como a grafia do português, se pretende oficial e oficiosamente seja agora adoptada em Portugal, consagra uma série de enormidades que não estão, nem podem estar, a ser aplicadas no Brasil e que aumentam a desconformidade com a maneira como a língua se escreve de um lado e do outro.
Talvez tenhamos de esperar que se realize um ano de Angola em Portugal e de Portugal em Abgola para o problema merecer atenção. E então não será de estranhar que tenhamos de agradecer aos angolanos um rigor na grafia da nossa língua de que, por cá, nós portugueses já não somos capazes.” (VGM, in DN, 21/11/2012, p. 54)

3. “ O Cadáver adiado”

“No Brasil tratava-se fundamentalmente de sacrificar o trema e o acento agudo em meia dúzia de casos. E ninguém se resignava às regras absurdas de emprego do hífen… Com isso, bastou o abaixo-assinado de uns 20 mil cidadãos para se adiar a aplicação de uma coisa trapalhona denominada Acordo Ortográfico (AO). Os políticos ouviram a reclamação, estudaram-na e assumiram-na, e a sr.ª Rousseff decidiu.
Em Portugal o número de pessoas que tomaram posição contra o AO já ultrapassava as 120 mil em Maio de 2009. Hoje, e considerando tanto o Movineto contra o AO de então como a actual Iniciativa Legislativa de Cidadãos (ILC) com a mesma finalidade, esse número é incomparavelmente mais elevado.
Portugal bem pode propor a todos os quadrantes ideológicos e parlamentares da sua classe política que se assoem agora a este cruel guardanapo.
Faltou-lhes a coragem de respeitar as opiniões autorizadas, a capacidade de reflectir com lucidez sobre o assunto, a vontade cívica de se informarem em condições.
Acabaram a produzir este lindo serviço com a notável excepção do relatório Barreiras Duarte, aprovado por unanimidade na Comissão Parlamentar de Ética, Sociedade e Cultura (Abril de 2008), mas que não teve qualquer efeito prático.
A CPLP, ao engendrar o torpe segundo protocolo modificativo do AO, violou sem escrúpulos o direito internacional e traiu a língua portuguesa. Não serve. Mostrou total inconsciência, incompetência, incapacidade e oportunismo na matéria.
Agora, é evidente que, de três uma: ou o Brasil vai propor a revisão do AO ou tratará de a empreender pro domo sem ouvir os outros países de língua portuguesa, ou fará como em 1945, deixando-o tornar-se letra morta por inércia pura e simples.
No primeiro caso, mostra-se a razão que tínhamos ao insistir na suspensão do AO, a tempo, para revisão e correcção. A iniciativa deveria ter sido portuguesa e muitos problemas teriam sido evitados.
No segundo caso, mostra-se além disso que continuamos a ser considerados um país pronto a agachar-se `mercê das conveniências alheias. Com a desculpa, a raiar um imperialismo enjoativo, da “unidade” da língua, em Portugal haverá sempre umas baratas tontas disponíveis para se sujeitarem ao que quer que o Brasil venha a resolver quanto à sua própria ortografia. Foi o que se passou em 1986 e 1990.
No terceiro caso, mostra-se ainda que ficaremos reduzidos a uma insignificância internacional que foi criada por nós mesmos.
Mas, em qualquer dos casos, a situação será muito diferente da actual.
O Acordo Ortográfico ficará incólume e as suas regras serão revistas e modificadas. Ninguém esconde no Brasil esta necessidade de revisão e correcção, tão cultural, social e politicamente sentida que está na base do adiamento decretado.
Se as regras vão ser modificadas, e quanto a este ponto não pode subsistir qualquer espécie de dúvida, será um absurdo absoluto que se mantenha a veleidade de as aplicar em Portugal na sua forma presente.
Não se pode querer contestar oficial ou, sequer, oficiosamente a existência de três grafias, nada menos de três, como resultado grotesco de uma tentativa sem pés nem cabeça de uniformização delas em todos os países que falam português: a brasileira, a angolama e moçambicana e a irresponsável que é a portuguesa.
Torna-se imperativo o reconhecimento oficial de que a única ortografia que está em vigor em Portugal é a que já vigorava antes das desastrosas pantominas que foram empreendidas pelo Governo Sócrates.
No meio desta vergonha, o mais simples é:
a) reconhecer-se que o AO nunca entrou em vigor, por falta de ratificação de todos os estados signatários;
b) reconhecer-se que, para além disso, continua a faltar um pressuposto essencial da sua aplicação que é o vocabulário ortográfico comum que nem sequer foi iniciado;
c) suspender-se tudo o que se dispôs em Portugal, nomeadamente no plano das escolas, dos livros escolares e dos serviços do Estado;
d) tomar-se a iniciar«tiva de negociações internacionais com vista a uma revisão e correcção do AO por especialistas dignos desse nome.
O Acordo Ortográfico é tão mal feito que nem o Brasil o aceita… Logo à nascença, já era um cadáver adiado. Com vénia de Fernando Pessoa, agora não se pode deixar que, sem a necessária revisão, ele procrie seja o que for.” (VGM in DN, 02/01/2013, p. 54).

4. “Urgentemente”

“Há uma semana, escrevi nesta coluna sobre o adiamento de aplicação do Acordo Ortográfico no Brasil, por decisão da presidente Dilma Rousseff, que atendeu uma série de protestos e manifestações pedindo a suspensão e revisão do documento.
As implicações da situação assim criada, no plano internacional, são por demias evidentes. Escusamos de pensar que as Repúblicas Populares de Angola e Moçambique vão ratificar o AO nos próximos tempos, uma vez que não o fizeram quando não se esperava esta reviravolta da posição brasileira e é perfeitamente claro que nada farão enquanto não souberem em que param as modas.
Esses países vão, e muito bem, manter o satatu quo e a norma ortográfica vigente que, repito mais uma vez, não é, nem pode ser, a do Acordo Ortográfico.
Sendo assim, e se Portugal nada fizer, o comando das operações ficará nas mãos do Brasil, que nunca mais aplicará o AO na sua forma actual. Note-se bem, nunca mais!
Não digo isto com pruridos patriotinheiros, mas na previsão de que as modificações que venham a ser introduzidas no AO corresponderão apenas a características fonéticas e ortográficas do português do Brasil, mantendo-se as diferenças em relação à língua que se fala e escreve deste lado do Atlântico.
Isto é, nesse caso o Brasil levará a efeito mais uma sua reforma ortográfica própria,arredando várias das regras do Acordo Ortográfico mais gravemente lesivas da língua que é falada nos restantes sete países interessados. Nestas circunstâncias, Portugal não tem qualquer interesse em aplicar o AO numa forma que, afinal, não vai ser adoptada em parte nenhuma…
Há, dir-se-á, muita coisa que já se escreve em conformidade com as suas bases, muitos livros escolares que também já são impressos nesses termos, muitas práticas públicas que procuram já aplicar as normas referidas, E portanto, voltar atrás implicaria custos muito consideráveis que a crise actual não nos permite suportar.
É óbvio que os custos não poderão deixar de se elevados. Os erros, por vezes, pagam-se muito caro, e este é um desses casos. Mas os custos, nesse caso, não podem ser desculpas para não se fazer nada!
A tudo isto pode sempre objectar-se de várias maneiras. Sem voltar a invocar os muitos argumentos jurídicos de que os oponentes do AO têm lançado mão, temos, por um lado, que não faz qualquer sentido aplicar-se uma “reforma” que se tornou substantivamente inaplicável e cujos objectivos e pressupostos se evaporaram na prática com o adiamento brasileiro.
Por outro lado, e no tocante às alterações nos livros e manuais escolares e às práticas do ensino em todos os seus níveis, deverá ponderar-se que, quanto mais tarde for alterada a presente situação, mais cara ela sairá ao povo português.
E sairá mais cara no plano cultural, no plano económico e no plano financeiro.
No plano cultural, porque será cada vez mais difícil a correcção e a erradicação dos erros e entretanto a tendência será para que a memória da ortografia de 1945 se vá perdendo injustificadamente.
No plano económico, porque em nada lucrará esta língua que é falada em oito países, enquanto factor de crescimento, de desenvolvimento e de progresso à escala planetária, com a adopção por parte de Portugal de bizarras soluções que mais ninguém adoptará.
No plano financeiro, porque, quanto mais tarde se proceder às inevitáveis modificações e correcções, mais dinheiro custará essa operação à escala do ensino, da edição, dos serviços públicos, dos jornais, etc., etc.
A questão escolar é especialmente relevante. Talvez o problema possa ser atenuado pelo facto de haver manuais, impressos sem as regras aberrantes do AO, cuja validade ainda se mantenha. Num período de transição e dado que os livros escolares valem por vários anos, é natural que não tenham todos sido substituídos.
Seja como for, qualquer opção que envolva a continuação da aplicação do AO na sua forma presente acabará por nos sair mais cara do que a sua suspensão imediata.
Uma criteriosa formação dos professores e dos responsáveis pela educação, uma acção bem desenvolvida e considerada de serviço público por parte da televisão, uma campanha bem estruturada na comunicação social para a qual se concite a adesão dos próprios jornais, podem ajudar a reduzir os custos envolvidos.
Impossível não é. E não pode deixar de ser feito. Urgentemente. (VGM, in DN, 09/01/2013, p.54)

[ Caro leitor, deparante de acaso ou adrede visitante: se está interessado mesmo em lutar pela defesa da nossa língua, na linha do que é dito, nesta crónica de VGM  e em todas as postagens deste blogue atinentes ao mal-afamado Acordo Ortográfico da nossa desgraça  e através do qual se pretende desgraçar a nossa querida Língua, procure ler todas essas referências e, se estiver convencido como nós estamos, leia neste mesmo blogue a postagem “Uma ILC contra o Acordo Ortográfico”. Depois, é só clicar neste link e assinar: http://ilcao.cedilha.net ]

Duas postagens, uma proposta e um reparo sindical

1. LÍNGUA: O ESCÁRNIO.
É um espectáculo de escárnio e maldizer. De escárnio, pois! Então, não? Pega-se num jornal (DN, por exemplo), seja ou não seja de referência (não se sabe bem de que referência… mas vamos lá: de referência, então). A gente vê que a maior parte dos textos seguem essa baralhada ortográfica a que chamam ‘acordo’ (eu chamo-lhe, simplesmente, ‘nem-brasileiro’). Mas, quando se chega às crónicas, ou seja, aos chamados colunistas, aí, deparamos com a língua portuguesa, escrita por bons cultores da língua, os melhores, se tivermos em conta todos os escritos do jornal. E, justamente, esses textos, numa percentagem para aí de 90%, trazem, ao fim, uma notinha onde se lê, por estas ou outras palavras que querem dizer o mesmo: “Por decisão pessoal do autor, este texto não segue a ortografia do [assim chamado] Acordo Ortográfico” (“assim chamado” é meu].

Quanto aos textos ortografados em meio-brasileiro, a gente sabe: os donos do jornal mandaram e os funcionários (jornalistas ou fazendo de conta…), cumprem a ordem, por imposição ou autocensura, claro.

E a gente pensa e diz: é isto um jornal de língua portuguesa?! Não, não é um jornal em língua portuguesa: é um escárnio à língua portuguesa! Escárnio, porque, precisamente, dentre os escreventes de todas aquelas páginas, os que, em nosso entender, melhor dominam a língua escrita, quiçá os que a cultivam com mais mestria – os colunistas – “tomam a decisão de não obedecer ao ‘acordo’, ou melhor, ao ‘desacordo’. Escrevem a língua como entendem que ela deve ser escrita hoje.

E, depois de folhearmos todo o jornal, só nos apetece dizer: então, é isto um jornal português?! Não! Isto é um escárnio à língua portuguesa!

2. LÍNGUA: A RECONQUISTA.
Depois da nomeação de Vasco Graça Moura (VGM) para o Centro Cultural de Belém, lembrei-me de compor uma postagem para o meu blogue, com este título: “E agora, Vasco?!”

Não o fiz. E o processo tem-se desenvolvido com uma rapidez tal que decidi para o texto este título que aí está: Língua: a reconquista..

Primeiro foi VGM em Belém. Agora é já a Universidade Clássica de Lisboa. (Que dois grandes bastiões!) E todas as outras instituições, do mesmo nível e da mesma responsabilidade, estão à espera de quê? Que Afonso Henriques volte com a sua espada, para, castelo a castelo, operar, com a sua força, a Reconquista da Língua? Que bela oportunidade perdeu a cidade de Henriques – Guimarães – Capital Europeia da Cultura! E as outras? A começar pelas escolas. Não tenham medo, que as editoras vão atrás. Ai não, não vão! Cidadãos, percam todos o medo, tenham coragem! Ou então, como diria o outro: não sejam piegas!

Vamos repor a nossa Língua!

3. A PROPOSTA.
Insistindo na ideia do ponto 1, é um espectáculo deprimente o que nos estão oferecendo a maior parte dos jornais deste País, do país de língua portuguesa: é que, na maior parte deles, não se chega bem a saber qual a língua: se o português, se o brasileiro, se uma mistela de português e brasileiro. (Sem qualquer obrigação: mais papistas que o papa?…). Também se refere lá que os que pressupostamente melhor dominam o português, ou seja, os escribas colunistas (aí pelos 90%), declaram em nota, no final do respectivo texto, que não “adotam” o AO, mas adoptam sim a “ortografia antiga”, querendo com isto dizer a ortografia da reforma de 45. Et pour cause! Eles é que têm razão, porque, à excepção dos seus textos, o resto é uma salgalhada que ninguém domina (nem pode dominar!) e que, também “adotada” em locais oficiais e nas escolas, só serve para atrasar a aprendizagem do ler e do escrever o português!

Sendo assim, aqui se propõe ao GRUPO LENA que dê ordem para que, em em todos os órgãos da Imprensa do seu domínio, se adopte obrigatoriamente a ortografia de 45, seguindo o exemplo do Centro Cultural de Belém, presidido por Vasco Graça Moura, e parece que também da Faculdade de Letras de Universidade Clássica de Lisboa. Estou muito triste com a revista do meu sindicato Escola Informação – SPGL. António Avelãs é director na fotografia, mas o texto é “escrito conforme o novo Acordo Ortográfico”. O Correio de Pombal, cujo prestigiado director, conhecido grande cronista e mais um bom cultor das letras, não tem problema em ‘avisar’, nos bons textos de sua autoria, que “não vai à bola com o Acordo Ortográfico”, poderia muito bem ser, aqui na Alta Estremadura, um pequeno mas valioso bastião da Reconquista da Língua. E, já agora, o Rodilha. Como estamos de ortografia? Cada uma escreve como entende? E porque não enfileirarmos todos na Reconquista?…

4. ESTE TEXTO, nos seus primeiros três pontos, foi publicado em O Correio de Pombal de 01.03.12, p. 10, e será em o Rodilha. As postagens estão no blogue. Ao receber as revistas do meu sindicato – SPGL – e da federação em que se integra – FENPROF – poderão calcular os meus queridos e admirados colegas dirigentes dessas instituições a tristeza (para não dizer coisas mais fortes) que me invade quando as leio e verifico quão é prejudicada a sua força de luta que têm demonstrado e em que eu me reconheço pela adopção (adoção… ou será adução?…) “dessa coisa obscena chamada acordo ortográfico” (Cf. Vasco Graça Moura). O bons dirigentes Nogueira e Avelãs, e companheiros, se calhar mais papistas do que o papa (quem os obrigava?…), resolveram estragar as revistas lançando nelas a “criminosa” (de novo VGM) estragação da Língua que, “criminosamente” (idem) está em curso. Só por isso, vejam vocês, apetece-me “desarriscar-me”.

Aqui, da retaguarda dos fragilizados, um forte abraço (pela luta que não pela escrita!), do

António Marques (SPGL, nº037094)

Acordo ortográfico: um post-scriptum de Vasco Graça Moura

É o post-scriptum à sua crónica semanal “O banco falimentar”, no DN de 7/Set./2011, p. 54, que, com a devida vénia, aqui se transcreve:

“Post-Scriptum: Na sua entrevista à “Única” do Expresso de 3 de Setembro, o ministro da Educação escamoteia deploravelmente a questão do Acordo Ortográfico, dizendo que este ‘é um facto’. Não é. Os factos são os seguintes: o Acordo Ortográfico não está em vigor. Angola e Moçambique não o ratificaram. Não existe o vocabulário comum que o AO exige como condição prévia. O ministro não estudou o problema, nem no aspecto jurídico nem no científico. Não leu a documentação existente. Não sabe quanto custa ao país a precipitação criminosa em aplicar um instrumento inaplicável e calamitoso. O facto é que Nuno Crato infelizmente não sabe do que fala. Se as reformas que ele prepara para o ensino forem tão levianamente abordadas como esta, então a Educação em Portugal não irá muito longe. Custa ver uma personalidade da sua envergadura intelectual e da sua intransigente seriedade ceder assim à lei do menor esforço.”

Deixem-me só acrescentar: a Língua Portuguesa e os seus falantes estão-lhe muito gratos, Vasco Graça Moura!

“Acordo, epistememas e cairologia”

Com a devida vénia e a solidariedade muito grata ao seu autor Vasco Graça Moura e ao DN que a publica (17/08/11, p.54), acha o autor deste blogue que não podia, de forma nenhuma, deixar de transcrever aqui esta “colossal” crónica, que não deixa nada a dever à prosa irónico-sarcástica dos grandes prosadores do século XIX, os maiores entre os maiores, a começar pelo grande Eça. Cá ficamos à espera da próxima quarta-feira. Contra o “obsceno” Acordo, tudo não é de mais! Aí vai então:

Sob o título arrasador de “Onze Teses contra os inimigos do Acordo Ortográfico”, o Público de 9 de Agosto publicou um artigo da autoria de Fernando dos Santos Neves, de quem somos informados ter sido “criador da primeira licenciatura portuguesa de Ciência Política, primeiro reitor da Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias e da Universidade Lusófona do Porto”. E segundo leio na Internet (http://revistas.ulusofona.pt/index.php/rhumanidades/article/view/1003), o autor do artigo, entre muitas outras qualificações e actuações tão famosamente retumbantes quanto esmagadoras, fundou a “Sociedade Africanológica de Língua Portuguesa (SALP)” e lançou o epistemema (sim, leitores, o epistemema) “Ruptura Epistemológica Primordial” (REP) como “a passagem de uma concepção monoparadigmática e reducionista a uma concepção pluriparadigmática e aberta do próprio conceito de ciência”.

Acresce que o número de “onze teses” configura já um autêntico estribilho curricular, uma vez que ele também é autor de mais “Onze Teses sobre o Ensino Superior em Portugal e no Espaço Lusófono”.

Com tanta artilharia pluriparadigmática, os “inimigos do Acordo Ortográfico” não ganharam para o susto e ainda se arrepiaram mais ao lerem que, na nona tese, o autor propõe para a CPLP “o nome mais cairológico e menos restritivo de Comunidade Lusófona”, implicando assim que a referência à língua portuguesa na sigla é afinal redutora. Adiante.

A primeira tese envolve uma referência a Marx com a fundamental apostilha epistemémica de que a preposição latina “Ad” significa “Contra”. É tanto uma tese como dizer-se que o autor elucubrou o arrojado epistemema “Ruptura Epistemológica Primordial”.

As restantes teses afinam por idêntico diapasão de pertinência… cairológica, com destaque para a quarta, de que se recorta o essencial: “bastaria um mínimo de lucidez para entender que é, precisamente, o Acordo Ortográfico que “permitirá a continuação da existência da ‘Língua Portuguesa’ no Brasil, etc., sem a qual ele, inevitavelmente se tornará, a breve trecho, a ‘Língua Brasileira’, como de algum modo principiaria a ser o caso”.

A prosa do criador do epistemema primordial é um tanto ou quanto rebarbativa. Repare-se naquele fatal “Brasil, etc.” e noutros requintes estilísticos de lógica expositiva e concordância gramatical. O mais curioso é que a tese, desta vez tão cairologicamente expendida em favor da designação da língua como “portuguesa” e figurando-se, a não ser assim, a emergência de “algum legítimo sofrimento para todos os portugueses”, contraria mui convictamente os enérgicos epistememas das quinta, sexta, sétima e oitava teses.

Estas são um autêntico azorrague cairológico para, respectivamente, as motivações patrioteiras dos editores que não leram o pequeno ensaio que o autor publicou no Público em 2006; os que não vislumbram que o AO é “uma questão político-estratégica”; os que vão na “ressaca colonialista”; os que padecem do “síndroma salazarista de Badajoz” (ao que o próprio autor não escapa inteiramente, pois fala no “Governo da Nação”)…

É certo que os epistememas que lhes correspondem se antolham visceralmente dialécticos para o fundador da Sociedade Africanológica de Língua Portuguesa (SALP), maxime o da sétima tese, pois esta permite estender a qualificação de “ressaca colonialista”, não se sabe se “de antanho” ou “de sempre”, não se sabe se cronológica se cairológica, à posição das repúblicas populares de Angola e de Moçambique que não ratificaram o AO.

Mas faça-se justiça. Há pelo menos duas das onze gloriosas que podemos reputar de verdadeiramente epistemémicas e inovadoras. Trata-se da terceira e da décima primeira: o autor, depois de reconhecer que “do ponto de vista técnico-linguístico” o Acordo Ortográfico “padece de muitos defeitos e carece de muitos aperfeiçoamentos”, sustenta que “a sua principal virtude é existir” (3.ª) e ainda que “o que importa, agora, é efectivamente começar a praticá-lo” (11.ª).

Da conjugação destas duas teses decorre, do enfático ponto de vista do criador do epistemema “Ruptura Epistemológica Primordial”, que um chorrilho de asneiras deve ser o factor de aproximação da maneira de escrever a língua portuguesa nos vários espaços em que é falada.

Duas crónicas do DN

Com a devida vénia, se transcrevem aqui:

1 – “O Marcelo diz que não percebe!”

(Baptista-Bastos, DN de 10/Agosto/2011, p. 7)

“Disse o Marcelo Rebelo de Sousa: “Não percebo porque é que o trabalho paga, e o capital não.” Claro que o Marcelo percebe muito bem o porquê do facto. Mas o Marcelo gosta muito de dizer coisas e de dissimular os factos. Não é com a aplicação de reajustamentos incidentais que o mundo se recompõe e Portugal melhora. O Marcelo, inteligente e perverso, nada tolo e muito ligeiro, é daqueles comentadores do óbvio que não arriscam nenhuma opinião contrária às opiniões dominantes. Irrita um pouco, à direita e à esquerda, mas trata-se de brotoeja passageira.

A afirmação do Marcelo, no comentário habitual, aos domingos, na TVI, constitui a repetição, dramática por ser repetição, do conteúdo do seu método de ideias. Acaso ele desejasse criar contenciosos, desfazer compromissos de classe e outros, atacar o preço pago pelo poder, tudo isso seriam razões do nosso contentamento. Sobretudo, do nosso esclarecimento fundamental. Mas não. No essencial, o Marcelo cala, consente, desvia, e crê, com cinismo e advertida fidelidade, no sistema louco que nos destrói e liquida lentamente.

O que é grave. O Marcelo é um intelectual muito arguto, muito lido, e muito capaz de nos surpreender. Assim, torna mais pesada a responsabilidade que lhe cabe nesta cumplicidade tenebrosa. O espectáculo mediático, por ele protagonizado, todos os domingos, é o fácil recurso à atenção dos outros. Claro que gosto de o ver e de o apreciar pessoalmente. Não faz batota. Ou, melhor, a batota que pratica é outra: pertence aos domínios da prestidigitação e do malabarismo. Sabe como nenhum outro preopinante das televisões, utilizar a frase-chave, a locução com efeito pirotécnico, a contradição como testemunho da diferença.

O Marcelo dá umas bicadas, pequeninas para não degenerarem em infecção, mas, infelizmente, nunca nos informa, nunca toma posição antagónica àquela que pertence ao discurso e à acção reinante. “Não percebo porque é que o trabalho paga, e o capital não.” A frase contém, no seu bojo, algo degradante, por imoral. O sistema de que é paladino permite e estimula a indignidade, aquela e outras mais.

O Marcelo, lido em Keynes, tem, desde há muito, conhecimento de que o capitalismo é autofágico porque não sobrevive à tentação de “fornecer os ricos com meios para que fiquem mais ricos”. E, também, de que esta etapa acelera o processo de dissolução do sistema, quando se lhe pode aplicar a metáfora de Dostoyevski, em Os Irmãos Karamazov: ‘Se não há Deus, tudo é permitido.’

Os factos estão ao alcance do nosso julgamento. As leis do “mercado” são-nos impostas sem debate, sem a formulação necessária para que as compreendamos.

O Marcelo diz que não percebe! Não percebe? Homessa!”

2 – “Docência e decência”

(Vasco Graça Moura, DN 10/Agosto/2011, p. 54)

“Não sei se Nuno Crato conseguirá pôr em prática os princípios que veio defendendo ao longo dos anos. Espero francamente que o consiga e não se fique pelas boas intenções, muito em especial no tocante ao ensino do português e da matemática, tanto no básico como no secundário.

O desastre da língua portuguesa tornou-se uma rotina trágica e pode ser visto a partir de vários ângulos que acabam por combinar-se do modo mais negativo.

Há quem entenda ser mais importante a mera eficácia comunicacional do que todos os aspectos ligados aos níveis qualitativos, mesmo elementares, de utilização da língua, enquanto elemento essencial de uma determinada identidade social e política e veículo de transmissão, de geração em geração, de testemunhos históricos, sociais e culturais imprescindíveis e irrenunciáveis. Há quem reconheça a importância da existência de uma norma-padrão, mas acrescente não ser viável defini-la de modo a distinguir o que é “correcto” do que é “incorrecto”, o que vem a redundar num álibi para o vale-tudo.

Por isso, aqui há uns anos, eu também perguntava neste jornal, se se poderia fazer tábua rasa da língua, entendida como modo de conhecimento e apreensão do mundo, depósito de um saber sedimentado pela memória e pela história, instrumento de criação cultural nas mais variadas modalidades do pensamento e da expressão, tão idóneo para a formação intelectual rigorosa como para a produção de efeitos estéticos irisada pelas emoções e por uma multiplicidade de valores afectivos, representando assim um potencial de riqueza inesgotável na comunicação humana.

Mas há mais problemas nas últimas décadas, o léxico da nossa língua “encolheu” consideravelmente, o que significa uma perda incalculável. É uma evidência que hoje a generalidade das pessoas, sobretudo as mais jovens e mesmo que tenham tido uma escolaridade supostamente normal, tem mais dificuldade em ler os chamados grandes autores. Não me refiro a casos especiais, como o de Aquilino Ribeiro. Nem a textos mais distantes de nós no tempo, como Fernão Lopes, Gil Vicente, Camões ou Vieira. Mas basta pegar em Garrett, Herculano, Camilo, Cesário, Eça, António Nobre ou Fialho: um grande número de significados e de formulações, de maneiras de dizer e de escrever o mundo e a condição humana, escapa aos leitores, o que acarreta o desinteresse crescente e o abandono dessas leituras, com a consequência do esquecimento trágico daquilo que tais autores e obras representam.

Nota-se também uma crescente dificuldade no tocante à gramática, às regras de concordância, à conjugação verbal, à sintaxe… É raro encontrar-se uma construção em que se combinem correctamente orações coordenadas e subordinadas (esta terminologia não pretende, como é evidente, dever nada `TLEBS).

Se formos à maneira de falar, o abastardamento da pronúncia da nossa língua ultrapassa as raias do concebível. E sendo este um aspecto em que a escrita condicionará inevitavelmente a oralidade, o chamado Acordo Ortográfico, para além de outras enormidades, constitui um crime por que terão de ser acusados Presidentes da República, Parlamentos, Governos, ministros e universidades, estas, quase sempre e salvo honrosíssimas excepções, por uma demissão e um silêncio institucionais e vergonhosos numa matéria em que tinham necessariamente uma palavra decisiva a dizer.

Os programas oficiais, por razões de inovação pedagógica insensata, ou de ideologia, ou outras, deram cabo do ensino do português e demitiram-se do grau de exigência imprescindível. É claro que há outros responsáveis, para além dos pretensamente científicos: os políticos, as famílias, os pais e encarregados de educação, os professores…Há alguns anos, também escrevi neste lugar que estamos perante um círculo vicioso: não se aprendeu a ensinar bem porque não se aprendeu bem e não se aprende bem porque não se é bem ensinado.

Oxalá Nuno Crato consiga cortar este nó górdio: corrigir os programas e pôr os docentes à altura das suas responsabilidades, criando condições para que as novas gerações aprendam, falem e escrevam um português decente. Se ganhar esta batalha no plano da docência, não deixará de a ganhar atombam no plano da decência.”

Lúcia Lepecki e “essas macacadas do acordo ortográfico”

Morreu Maria Lúcia Lepecki, brasileira e ilustríssima professora universitária em Portugal. “Mulher superiormente inteligente, culta e afável, que fez muito pelos escritores portugueses, pela cultura portuguesa” (Baptista-Bastos in DN de 25/7/2011, p. 18 ) e que “era a pessoa certa para se fazer a aproximação entre as culturas brasileira e portuguesa, sem essas macacadas do acordo ortográfico” (Vasco Graça Moura, ibidem). Vejam vocês bem: brasileira, professora de literatura portuguesa, abertamente contra o Acordo Ortográfico que, do Brasil, nos querem impor!

A propósito de AO: bem andou a Priberam que “lançou uma nova versão do seu dicionário, a primeira a permitir a consulta em português europeu e português do Brasil pré ou pós-acordo ortográfico. A empresa lançou ainda uma aplicação de acesso ao dicionário Priberam para Android, que já suporta as quatro opções de consulta agora disponíveis” (in Notícias Magazine, 24/Julho/2011, p. 9).

“Uma coisa obscena chamada Acordo Ortográfico”

O título é tirado da oportuna crónica de Vasco Graça Moura no DN de 29/06/2011, p. 54, da qual, com a devida vénia e a minha continuada militância anti-Acordo, vou trazer para aqui uns excertos, para que deparantes de acaso ou adrede visitantes possam partilhar connosco a força que temos desenvolvido e expressado no sentido de evitar ainda que esse disparate a que eu já chamei, neste blogue, o Alcácer Quibir da Nossa Língua, que Sócrates ratificou, como o pateta Sebastião encabeçara, gritando por S. Jorge, o outro Alcácer Quibir – o da Pátria. E aí vão excertos que considero mais significativos, para que quem com eles depare aqui, não deixe de ir ler a crónica toda que tem o sugestivo título “O reino da insensatez”. Eis:

1. “Neste quadro de catástrofe anunciada, é preciso afirmar mais uma vez, que esta não é a altura de aplicar em Portugal uma coisa obscena chamada Acordo Ortográfico!” […]

2. “Essa aplicação traria custos terríveis: as famílias teriam de gastar rios de dinheiro em novos livros, manuais, dicionários e outros materiais escolares; tanto professores como alunos sentiriam os maiores problemas de adaptação; os custos sociais, por exemplo, no tocante aos idosos e até a certos deficientes, seriam igualmente graves; os editores (e não apenas os do livro escolar) veriam os seus stocks inutilizados; quanto aos restantes custos económicos, o melhor é nem falar. O desperdício seria chocante: iriam para o lixo milhões e milhões de páginas que servem perfeitamente para o ensino!” […]

3. “Isto é tanto mais grave quanto é certo que o Acordo Ortográfico não se encontra em vigor.”

4. “Não vale absolutamente nada um protocolo, laboriosamente parturejado na CPLP, para forçar os países que não querem acordo nenhum a “engolirem” o dito, lá porque houve três ratificações “ […]

5. “Em Portugal está-se a adoptar uma série deplorável de dislates” […]

6. “Toda esta trapalhada sem nome significa que é preciso pôr cobro a um crime contra a língua portuguesa.”

As duas crónicas antípodas

Como acontece todas as quartas-feiras, há duas crónicas no DN que eu não deixo nunca de ler: a do Baptista-Bastos (página 7) e a do Vasco Graça Moura (página 54). Dois grandes e bons falantes (nível oral e nível escrito) da língua de Camões. Cada um deles apodado de “Escritor”, como sob o nome se pode ler. Eu por mim até acho que o jornal não fazia  nada de mais se pusesse lá, em ambos, “Grande escritor”. Ponto final parágrafo.Vamos lá então ao assunto: as duas crónicas no DN de 05/01/2011. Sobre o mesmo assunto, sobre o mesmo tema, sobre o mesmo candidato: Cavaco Silva.

Comecemos pela última: “A candidatura séria”.

A candidatura de Cavaco Silva tem sido construída a partir de um candidato que prestou provas mais do que bastantes quer da sua competência e capacidade políticas e técnicas, quer da maneira como interpreta os poderes que a Constituição lhe confere e como compreende o seu mandato de Chefe do Estado. É uma candidatura séria, nem ‘messiânica’ nem ‘sidonista’…

E por aí fora em estilo encomiástico , com o seguinte destacado: “Credibilidade de um candidato não pode medir-se em função da retórica eleitoral.”

Agora, a primeira: “Da inépcia como virtude”.

Devo confessar, à puridade, um desejo modesto, porém ardente: gostava de que o Presidente fosse um homem culto, lido, cordial e descontraído. Não o é. E o meu recatado desgosto consiste no facto de ele desencadear, com as deficiências culturais e aleijões de carácter que demonstra, um generalizado reflexo condicionado. Os dez anos que levou de primeiro-ministro constituíram um cerco e o esmagamento das desenvolturas e das exaltações que o 25 de Abril nos tinha proporcionado.

E por aí fora, no belo estilo irónico e, quando é preciso, sarcástico, como, no último parágrafo: “Já cansa repetir que o dr. Cavaco é um incidente desgraçado na nossa história próxima recente. Metáfora de um país sem juízo também não chega.”

Agora, para terminar. É claro que os dois cronistas são dois bons escritores, ambos homens de letras, homens de cultura. Nem duvido que, em governos consentâneos com as respectivas tendências políticas, ambos poderiam ser bons ministros da cultura. Mas tenho uma enorme dificuldade em perceber como é que um escritor, um poeta  do gabarito de VGM, que até já nos facultou, traduzidos, belos decassílabos de Dante e belos alexandrinos de Corneille, e que tanto merece, ainda, a nossa admiração pelo que militou contra o famigerado Acordo, tenha escrito uma crónica destas, a começar logo por este título – “A candidatura séria”. Assim mesmo, com a exclusividade semântica roçando o insulto às outras todas, que lhe confere o uso do artigo definido. A candidatura séria? A sério?…